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Narrador onisciente: o que é e como usar em sua história

Narrador onisciente: o que é? Exemplos, tipos e como escrever

Ao escrever uma história, prestamos muita atenção aos personagens, enredo, ritmo e cenário, mas muitas vezes esquecemos um componente essencial: o narrador. Este é dividido em três, sendo que cada um deles tem sua particularidade.

O narrador onisciente é um dos mais interessantes entre eles, trazendo muitas possibilidades em seu estilo de narração. Apesar disso, são poucos os autores que o conhecem a fundo, e menos ainda os que conseguem aplicá-lo em seus livros.

Pensando nisso, neste artigo, explicaremos o que é o narrador onisciente em detalhes, identificando suas características, tipos e exemplos, com dicas de como você pode aplicar essa narração emblemática na sua história. Fique com a gente e confira!

Narrador onisciente: o que é? Exemplos, tipos e como escrever

O que é o narrador onisciente?

O narrador é aquele que conta a história do livro, sendo dele o ponto de vista pelo qual os leitores irão experienciar a trama. O narrador onisciente, por sua vez, é um dos três principais tipos de narradores existentes na literatura.

Também chamado de onipresente, o próprio nome, que significa “aquele que tudo sabe”, indica sua principal característica: ele tem um conhecimento profundo e total sobre todas as partes do enredo.

Além de saber a trama por inteiro, ele também conhece os personagens intimamente. Nesse tipo de narração, é comum entrar na cabeça dos personagens, mostrando ao leitor seus pensamentos, sentimentos, motivações, medos e anseios de forma mais íntima.

Seu foco narrativo é em terceira pessoa, ou seja, o narrador não faz parte da história que está contando. Sendo assim, não tem falas, não interage com personagens e não realiza ações de impacto na trama.

É como se observasse tudo de cima, como um deus que conhece o passado, presente e futuro dos personagens, além de tudo o que já passou por suas cabeças. Desse modo, oferece uma visão ampla da história, mas ainda mantém os personagens próximos ao leitor

Outra característica comum é a utilização de descrições detalhadas. Podem oferecer ao leitor informações que o próprio protagonista desconhece, utilizando os detalhes para pintar uma cena mais completa e envolvente. 

Sendo assim, esse tipo de narração tem caráter íntimo, profundo e detalhado, tendo um conhecimento abrangente tanto sobre o enredo quanto sobre o psicológico dos personagens.

Atenção: o narrador onisciente não é o autor em si, mas sim uma voz criada especialmente para a obra. É como o eu-lírico na poesia,  podendo até ser inspirada pelo escritor, mas sendo um ser imaginário, que o autor utiliza para contar a história.

Tipos de narrador onisciente

Esse tipo de narração pode seguir por diferentes caminhos, sendo que cada um deles tem suas próprias características. Confira aqui os tipos de narrador onisciente:

Narrador onisciente neutro

O narrador onisciente neutro é aquele que conhece intimamente os personagens e o enredo, mas não insere sua opinião ou conduz o leitor a nenhuma conclusão. Narra a trama de maneira imparcial e, como o nome diz, neutra.

É um pouco mais distante do leitor, se abstendo de comentar sobre a história que conta. Ainda assim, mergulha na cabeça dos personagens, muitas vezes externando seus pensamentos, mas sem fazer juízos de valor acerca de suas ações e dos acontecimentos da trama.

Como exemplo, temos Orgulho e Preconceito, de Jane Austen:

Elizabeth sentia-se de tão bom humor que, embora não dirigisse muitas vezes a palavra a Mr. Collins, exceto quando a isto era obrigada, não pôde deixar de perguntar se ele tencionava aceitar o convite de Mr. Bingley e se julgava apropriado tomar parte naquele divertimento mundano; com grande surpresa ficou sabendo que Mr. Collins não tinha o menor escrúpulo a esse respeito e que nem de longe temia uma repreensão do arcebispo ou de Lady Catherine de Bourgh por tomar parte numa dança.

Narrador onisciente intruso

O narrador onisciente intruso é aquele que, além de entrar na cabeça de um ou mais personagens e saber tudo o que está passando na trama, dá sua opinião acerca do que está narrando. Normalmente, quer levar o leitor a ter uma visão específica sobre a história.

É a contrapartida do neutro, possui personalidade própria e pode falar diretamente com o leitor, por vezes fazendo piadas, dando avisos e tecendo críticas. É parcial, mas ainda narra os acontecimentos, ações e pensamentos dos personagens de maneira ampla e detalhada.

Como exemplo, temos Quincas Borba, de Machado de Assis:

Rubião estremeceu diante deste possessivo: nossa ausência. Achou-lhe um princípio de cumplicidade. Concordou que podiam dar pela nossa ausência. Tinha razão, deviam separar-se; só lhe pedia uma cousa, duas cousas; a primeira é que não esquecesse aqueles dez minutos sublimes; a segunda é que, todas as noites, às dez horas, fitasse o Cruzeiro, ele o fitaria também, e os pensamentos de ambos iriam achar-se ali juntos, íntimos, entre Deus e os homens.

O convite era poético, mas só o convite. Rubião ia devorando a moça com olhos de fogo, e segurava-lhe uma das mãos para que ela não fugisse. Nem os olhos nem o gesto tinham poesia nenhuma.

Narrador onisciente múltiplo

Já o narrador onisciente múltiplo possui opiniões e percepções variadas ao longo da história que conta, alternando entre elas. Sua intenção é que o leitor tome partido e se posicione sobre algum personagem ou ação.

Ele transita entre os pontos de vista durante a trama, muitas vezes se adaptando às crenças, pensamentos e personalidade dos personagens. Como os outros tipos, tem um conhecimento amplo, usando disso para apresentar diversas visões da história.

Como exemplo, temos Vidas Secas, de Graciliano Ramos

Sentindo a deslocação do ar e a crepitação dos gravetos, Baleia despertou, retirou-se prudentemente, receosa de sapecar o pelo, e ficou observando maravilhada as estrelinhas vermelhas que se apagavam antes de tocar o chão. Aprovou com um movimento de cauda aquele fenômeno e desejou expressar a sua admiração à dona. Chegou-se a ela em saltos curtos, ofegando, ergueu-se nas pernas traseiras, imitando gente. Mas sinha Vitória não queria saber de elogios. 

— Arreda!

Deu um pontapé na cachorra, que se afastou humilhada e com sentimentos revolucionários. 

Sinha Vitória tinha amanhecido nos seus azeites. Fora de propósito, dissera ao marido umas inconveniências a respeito da cama de varas. Fabiano, que não esperava semelhante desatino, apenas grunhira: — “Hum! hum!” E amunhecara, porque realmente mulher é bicho difícil de entender, deitara-se na rede e pegara no sono. Sinha Vitória andara para cima e para baixo, procurando em que desabafar. Como achasse tudo em ordem, queixara-se da vida. E agora vingava-se em Baleia, dando-lhe um pontapé.

Qual a diferença entre narrador onisciente e narrador observador?

Esses dois tipos de narração são muito confundidos entre si, visto que ambos têm o foco narrativo em terceira pessoa. Embora possam soar parecidos, principalmente quando falamos de narrador onisciente neutro, há uma grande diferença entre esses tipos de narração. 

Enquanto o observador se atém aos fatos e ações, o onisciente mergulha no íntimo dos personagens, também contando suas emoções e pensamentos. Sendo assim, um é mais superficial e distante, enquanto o outro é mais profundo e íntimo.

Como escrever com narrador onisciente

Agora você sabe o que é um narrador onisciente, suas características e principais tipos, pode estar se perguntando como aplicar isso na própria obra. Preparamos algumas dicas para ajudar você a escrever com um narrador onisciente:

Utilize a terceira pessoa

Pode parecer óbvio, mas esta é uma dificuldade genuína para muitos autores iniciantes. Utilize os pronomes ele/ela ao se referir aos personagens e conjugue os verbos da maneira correta, atentando-se para a concordância verbal e nominal. 

Ao invés de escrever uma cena como se você fosse o personagem, escreva como se estivesse falando dele para alguém. Um exemplo: ao invés de “enquanto caminho pelas areias da praia, sinto o mar molhar meus pés”, escreva “enquanto ela caminha pelas areias da praia, sente o mar molhar seus pés”.

Estruture sua história

Para que o narrador saiba tudo sobre a história, é necessário que, antes, o próprio autor tenha esse conhecimento. Estruture seu enredo com antecedência, para ter uma base de informações que pode utilizar na narração, sabendo melhor como conduzir a história.

Não se esqueça de inserir no planejamento a criação de seus personagens, indicando seus objetivos, características e personalidades. Você pode fazer tudo isso através do nosso Manual de Desenvolvimento de Narrativas de uma maneira prática e fácil!

Mantenha a narração coesa

Não varie de estilo de narração no decorrer da trama. Isso pode causar um estranhamento em seus leitores, que começaram a história de um modo e de repente são inseridos em outro. Se optou pela neutralidade, por exemplo, não insira a opinião do narrador no meio do livro.

Isso também serve para o foco narrativo. Embora seja possível ter alguns trechos em primeira pessoa, principalmente ao transcrever pensamentos dos personagens, mantenha sua escrita focada na terceira pessoa. Assim, você evita confundir o leitor e preserva a coerência da trama.

Seja detalhista

Seja detalhista em suas descrições, desenhando cenas nas cabeças de seus leitores. Descreva cenários, ações e acontecimentos de maneira vívida, focando em detalhes que passariam despercebidos até mesmo pelo protagonista.

Não descreva apenas os acontecimentos, mas também as emoções e pensamentos mais profundos dos personagens. Dessa maneira, você aumenta a conexão do leitor com a história, tornando o livro mais envolvente.

Se aprofunde no psicológico dos personagens

Apesar de ter uma visão mais geral da história, é a capacidade de entrar na mente das figuras da trama que faz essa escrita tão íntima. Aprofunde-se na psique de suas personagens, explorando seus pensamentos e sentimentos na narrativa.

Experimente traduzir os pensamentos através do discurso indireto. Se quiser inserir o leitor ainda mais no psicológico de seus personagens, você pode utilizar o recurso do fluxo de consciência, mergulhando o leitor direto em seus pensamentos.

O narrador onisciente é, com certeza, um dos tipos de narradores mais fascinantes. Uma mistura de observador com personagem, tem conhecimento aprofundado sobre a história, mas não sacrifica a intimidade com o leitor.

Esperamos que, a partir deste artigo, essa categoria tenha ficado mais clara para você. Aplicando nossas dicas, você com certeza terá mais facilidade para desenvolver uma história usando esse tipo de narração!

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Continue acompanhando o Blog da Viseu para mais dicas de escrita, notícias do mercado editorial, entrevista com autores e muito mais. Nos vemos no próximo conteúdo!

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